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As Escolas Filosóficas da Índia: Os Dárshanas

Atualizado: 14 de nov. de 2024



No texto anterior, exploramos as sagradas escrituras hindus, fundamentais para compreender a tradição espiritual da Índia. Agora, daremos um passo adiante e nos aprofundaremos nas Escolas Filosóficas da Índia, ou Dārśanas, que são os diferentes sistemas de pensamento que interpretam essas escrituras. Cada uma dessas escolas oferece uma perspectiva única sobre a realidade e a natureza do conhecimento, e é a partir delas que se delineiam as diversas formas de entendimento filosófico e espiritual na tradição hindu. Além disso, muitos dos termos usados por Helena Blavatsky em sua obra A Doutrina Secreta — que é, na verdade, um comentário sobre O Livro de Dzyan — derivam dessas escolas, bem como de outras tradições, e foram utilizados para construir sua interpretação esotérica dos mistérios universais expressos nessas obras.


As escolas filosóficas da Índia, conhecidas como Dārśanas (ou Dárshanas), representam diferentes pontos de vista ou perspectivas sobre a realidade. A palavra Dārśana vem da raiz sânscrita "dṛś", que significa "visão" ou "olhar", refletindo a ideia de uma maneira única de perceber e compreender o mundo.


Cada Dārśana foi articulado por um autor canônico por meio de sutras, ou seja, aforismos concisos, que sintetizam seus principais ensinamentos. Esses aforismos cristalizaram-se ao longo do tempo, formando distintos pontos de vista que orientam a interpretação das experiências espirituais e filosóficas dentro da tradição hindu.


Os Dārśanas podem ser classificados em ortodoxos e heterodoxos. Os Dārśanas ortodoxos, também conhecidos como Āstika Dārśana, são considerados os mais tradicionais dentro da filosofia hindu. O termo Āstika significa literalmente "aqueles que acreditam no conhecimento das coisas divinas", ou seja, aqueles que aceitam as escrituras sagradas como fonte legítima de conhecimento.


Existem seis escolas ortodoxas principais, cada uma com seu enfoque específico:


  1. Sāṃkhya, que é uma escola filosófica descritiva, focada na análise das categorias fundamentais da realidade.


  2. Nyāya, a escola lógica, que se dedica ao estudo dos métodos de raciocínio e argumentação.


  3. Vaiśeṣika, que segue uma abordagem atomista, propondo que tudo no universo é composto por partículas indivisíveis.


  4. Yoga, voltada para a prática, que enfatiza a disciplina mental e corporal como meio de alcançar a autotranscendência.


  5. Mīmāṃsā, que foca nos rituais cerimoniais e na interpretação das escrituras védicas.


  6. Vedānta, que é uma escola metafísica, dedicada à investigação da natureza última da realidade e da relação entre o ser humano e o absoluto (Brahman).


Essas seis escolas ortodoxas formam a base da filosofia hindu clássica, cada uma oferecendo uma abordagem única para a compreensão do universo e da experiência espiritual.


Essas escolas são chamadas de ortodoxas porque reconhecem e respeitam a autoridade dos Vedas, as escrituras sagradas hindus. Além disso, há três afirmações fundamentais que não são questionadas dentro dessas tradições, sendo consideradas como axiomas, semelhantes a princípios matemáticos ou lógicos, que servem como base para todo o sistema filosófico:


  1. A existência de um princípio Divino universal. No Vedānta, esse princípio é Brahman, a existência incondicionada. Também é Iśvara (ou Ishwara), o Senhor, concebido como uma unidade criadora vibrante, ígnea, pura Vontade, Inteligência e Sabedoria. Na filosofia Sāṃkhya, é chamado de Purusha, que é o Espectador Silencioso do que acontece.


  2. A doutrina do Karma, a Lei de Ação e Reação, e sua lógica consequência, a Reencarnação em uma sucessão quase interminável de vidas até completar o ciclo em que Ātman (o Ser, segundo o Vedānta, equivalente ao Purusha Individual do Sāṃkhya) se funde com Brahman (o Purusha Universal).


  3. A Lei da Evolução. Tudo está em movimento em direção a Brahman; a natureza se transforma e as almas (Ātman - Purusha) vão assumindo formas e veículos cada vez mais aptos para a sua luz espiritual e transcendência. O caminho do conhecimento e a cessação do erro permitem acelerar esta mesma evolução, pois a consciência, quando desperta, pode acelerar o tempo através da condensação das vivências. O Vedānta não aderiu completamente a este fundamento.


As Āstika Dārśanas podem ser divididas em dois grupos de três, cada um com sua abordagem única. As três escolas a seguir tratam exclusivamente do Ser (Purusha) e são classificadas como Āstika Purusha Dārśana:


Yoga:


Yoga, que significa "união", foi codificado por Patañjali por volta de 360 a.C. Seu objetivo é a união do homem consigo mesmo (Atman) e com o Todo (Brahman). É uma filosofia predominantemente prática.


Os Yogāsūtras de Patañjali são o tratado fundamental desta escola, além de estarem espalhados por diversas outras escrituras. Contudo, sua interpretação verdadeira e secreta só é acessível a iniciados.


O objetivo do Yoga é alcançar o estado de Samādhi, um estado de hiperconsciência e êxtase. Para chegar a este estado, é preciso despertar e ativar a Kundalinī, uma energia latente e disponível no complexo psico-físico do ser humano.


As oito etapas para alcançar o Samādhi, resumidamente, são:


  1. Yama: Princípios morais como não-violência, honestidade, não roubo, castidade e não possessividade.


  2. Niyama: Regras morais, contentamento, austeridade, estudo e contemplação.


  3. Āsana: Posições corporais que simbolizam ideias e poderes arquetípicos, além de refletir a atitude da alma na vida.


  4. Prāṇāyāma: Ciência da respiração e circulação de energia vital.


  5. Pratyāhāra: Abstração dos sentidos.


  6. Dhāraṇā: Concentração.


  7. Dhyāna: Contemplação.


  8. Samādhi: União definitiva ou temporária com o Todo, o incondicionado e o eterno, resultando em êxtase divino.


Essas etapas são comumente conhecidas como Aṣṭāṅga Yoga, que significa literalmente as oito (Aṣṭa) partes (Aṅga) do Yoga. É importante não confundir o Aṣṭāṅga Yoga com o Aṣṭāṅga (oito partes) Sādhanā (prática).


As oito partes do Yoga (Aṣṭāṅga Yoga) abrangem não apenas a prática física, meditação, entre outros, mas também aspectos relacionados a atitudes e hábitos do dia a dia, como o Yama e o Niyama.


As oito partes da prática do Yoga (conhecidas como Aṣṭāṅga Sādhanā) abrangem uma série de práticas que incluem Āsanas, Prāṇāyāmas e outras técnicas, como Mudrā, Pūjā, Mantras, entre muitas outras. Essas práticas formam uma maneira estruturada de organizar uma sessão ou aula de Yoga. Em um momento posterior, discutiremos detalhadamente o Yoga, seus oito aspectos e a estrutura de uma prática dividida em oito partes, abordando tanto sua versão tradicional oriental quanto sua adaptação para as escolas de mistério ocidentais, onde frequentemente é utilizada como treinamento e preparação mágica.

Sāṃkhya:


Sāṃkhya, que significa "número", foi codificado por Kapila e oferece uma exposição teórica completa sobre a natureza humana, enumerando e analisando detalhadamente sua mútua cooperação.


A escola Sāṃkhya, cujo nome significa "enumeração", baseia-se no conhecimento das 24 categorias do ser, na capacidade de discernir a ordem presente na Natureza e na percepção das transformações da matéria diante do Espírito (Purusha), que é o observador silencioso de toda a evolução.


Esta filosofia descreve a descida do Espírito na matéria, ativando suas três guṇas ou qualidades: rajas (excesso), tamas (inércia) e sattva (equilíbrio), e mergulhando nela em 24 estágios ou tattvas, desde o mais sutil (mahat) e a consciência do Eu (ahamkāra), até os cinco órgãos de ação, os cinco órgãos de percepção (ou sentidos), cinco elementos sutis e cinco elementos grosseiros (Éter, Ar, Fogo, Água e Terra).


Prakṛti, a Natureza ideal, pura e perfeita na presença do Espírito (Purusha), evolui do estado menos manifestado para o mais manifestado, condensando e gerando progressivamente todos os seus produtos evolutivos.


Purusha, como uma luz espiritual ou "observador silencioso", é o que possibilita que tudo seja feito, sem o qual nada pode ser realizado. No entanto, é aquele que, em si, não realiza ações. Ele é comparado ao centro de uma roda que não avança nem toca o caminho, mas sem o qual não haveria uma roda.


O tratado fundamental desta filosofia é o Sāṃkhya Kārikā, composto por 72 versos ou sutras, atribuídos a Kapila, que oferece ensinamentos sublimes, como a visão do Supremo como liberdade pura e a compreensão do Ser como Ser, puro e simples. Também destaca a analogia do leite inconsciente que nutre o bezerro, comparada à função de Prakṛti em favorecer a liberdade do Espírito.


Sāṃkhya também é citada no Bhagavad Gītā, no capítulo que aborda o "Campo" e o "Conhecedor do Campo". Esse trecho descreve a Prakṛti (a Natureza, o aspecto objetivo da existência, com suas inúmeras formas e véus) e Purusha (o Eu Universal, o aspecto sujeito da Realidade) como um cego (Prakṛti, que age, mas não vê ou compreende) e um coxo (Purusha, que vê e compreende, mas não age).

Vedānta:


Vedānta, que significa "final dos Vedas", foi codificado por Bādarāyaṇa e ensina que a única verdade e realidade é Brahman, e que todas as coisas são manifestações de Māyā (natureza ilusória). Ensina também que a busca espiritual visa à fusão entre o Eu individual (Ātman) e a Realidade Absoluta (Brahman). Seus textos fundamentais incluem as Upaniṣads, os Brahma Sūtras e a Bhagavad Gītā.


Os Brahma Sūtras abordam a existência humana, o universo e o caminho para a Realidade Absoluta. Brahman é a causa de toda a existência e pode ser concebido com ou sem atributos. A alma (jīvātman) é regida pela lei do Karma e da reencarnação. A doutrina dos 5 Koshas descreve os invólucros que separam a alma da realidade. Por trás dos véus está a unidade, cuja irradiação é a base de tudo que existe.


  1. Annamaya Kosha, o corpo físico, que necessita de alimento (anna);


  2. Prāṇamaya Kosha, o corpo vital (prāṇa), que une o corpo à mente e se percebe na respiração;


  3. Manomaya Kosha, o corpo mental, onde residem os 5 órgãos de percepção e a mente que os sintetiza e justifica. Aqui reside a memória e o sentimento da própria individualidade egoísta (ahamkāra);


  4. Vijñānamaya Kosha, o corpo de discernimento e inteligência (buddhi), onde reside a sabedoria e a faculdade de discernimento;


  5. Ānandamaya Kosha, o corpo da felicidade, aquele que nos permite vagar na eternidade do Ser.]


Essa é uma das formas de observar os invólucros que o Ser toma para si. Existem outras classificações, como a setenária, que inclui o Corpo Astral (Kāmamaya Kosha ou Corpo de Desejos), assim como uma divisão do Manomaya Kosha em Superior e Inferior, separando o Corpo Mental do Corpo Causal, ou da Vontade. Essa versão é a utilizada dentro da Teosofia e demais escolas de mistério ocidentais. Veremos sobre os sete corpos do ser humano completo mais adiante.


As três escolas a seguir estão mais diretamente ligadas à Natureza e têm uma base mais material e lógica para a composição de sua teoria, tratando da matéria (Prakṛti) e sua interpretação. São chamadas de Āstika Prakṛti Dārśana.


Vaiśeṣika:


Vaiśeṣika, que significa "discriminação", ensina que a liberdade consiste no conhecimento da realidade e na distinta conceituação dos elementos dessa realidade. Aceita as nove categorias básicas da matéria como base para a formação do Universo: terra, água, fogo, ar, éter, espírito, mente, tempo e espaço. Acredita que toda a realidade é composta por átomos, chamados de vīśeṣa em sânscrito, que são os blocos fundamentais de tudo o que existe e a causa de todos os processos naturais.


Kaṇāda é considerado o sábio fundador dessa escola, sendo o compilador do texto original, os Vaiśeṣikasūtras. Mais tarde, no século V ou VI d.C., Prāśastapāda elaborou um comentário que solidificou esse Dārśana.


A escola Vaiśeṣika é realista, afirmando que tudo o que percebemos realmente existe, e que as almas imortais não são diferentes dos átomos materiais que compõem a realidade. Ela também é pluralista, acreditando que a base da realidade é múltipla. No entanto, não é materialista, pois reconhece a existência de Deus (Brahman), a natureza não material das almas e o vínculo invisível entre causa e efeito.


A teoria da escola sugere que toda a matéria física provém de quatro tipos diferentes de átomos ou substâncias elementares: Terra, Água, Ar e Fogo, além de quatro substâncias não atômicas: Éter (associado ao som), Espaço, Tempo e os Eus.


O conhecimento ou consciência é visto como a natureza do Ser, mas depende de um objeto para existir. O erro surge da ignorância e ocorre quando confundimos um objeto novo com outro que vimos anteriormente.


Kaṇāda identifica sete Categorias do Real (padārthas), sendo três perceptíveis e quatro dedutíveis. Todas elas são consideradas existentes, compreensíveis e nomeáveis. Essas categorias se relacionam com a Constituição Septenária da Natureza proposta por Helena Petrovna Blavatsky.


As sete categorias (padārthas) são:


  1. Substância: Elementares (Terra, Água, Ar, Fogo) e não elementares (Éter, Tempo, Espaço, Alma e Mente).


  2. Qualidade: Universais (tendência, peso, distância, proximidade, conjunção, disjunção, distinção, tamanho, número, fluidez) e particulares (tato, olfato, gosto, cor, som, mérito, demérito, desejo, aversão, esforço, conhecimento, prazer, dor, viscosidade).


  3. Atividade: Movimentos para cima, para baixo, contração, expansão, horizontal.


  4. Universalidade/Generalidade: A existência mais elevada e a inferior que representam as sete categorias.


  5. Particularidade (vīśeṣa).


  6. Inerência (samavāya).


  7. Não-existência (abhāva).


As três primeiras categorias constituem o mundo sujeito à impermanência, causa e efeito, individualidade e generalidade, enquanto as quatro últimas são independentes, eternas e não causais. Seu conhecimento é inferido por intuição ou análise lógica, mas não por experiência empírica.


Nyāya:


Nyāya, que significa "lógica" ou "investigação", tem como meta a libertação do mundo das experiências e do ego humano (ahamkāra).


A escola Nyāya é uma escola lógica que se destaca por apresentar um método e uma teoria do conhecimento. A palavra "nyāya" significa "método", "regras", "justiça" ou "julgamento" em sânscrito. A base documental dessa escola são os Nyāya Sūtras, atribuídos a Aksapāda Gautama, datando possivelmente do século VI a.C.


Essa escola está intimamente ligada à Vaiśeṣika, que adota uma visão atomista e materialista do universo. O método lógico da Nyāya também é utilizado, com variações, por outras Dārśanas devido à sua solidez.


A Nyāya explora como conhecemos o que conhecemos e quais são as fontes do correto conhecimento, chamadas de pramāṇas.


A Nyāya reconhece quatro pramāṇas fundamentais:


  • Pratyakṣa: Conhecimento adquirido através da experiência sensorial, como ver, ouvir, cheirar, tocar e saborear. É equiparado à empiria aristotélica, sendo a base inicial do conhecimento.


  • Anumāna: Conhecimento obtido por inferência lógica ou raciocínio dedutivo. Pode envolver a dedução de um efeito desconhecido a partir de uma causa conhecida, ou vice-versa.


  • Upamāna: Conhecimento adquirido por comparação ou analogia, ao encontrar semelhanças com algo já familiar.


  • Śabda: Conhecimento obtido através de testemunho fiel, seja por meio de uma fonte confiável presente ou passada, ou por textos sagrados e ensinamentos de mestres.


Essas quatro fontes de conhecimento permitem enriquecer nossas vidas e construir uma tradição e uma aquisição de saberes essenciais para a cultura.


Mīmāṃsā ou Pūrva Mīmāṃsā:


Pūrva, que significa "antigo" ou "velho", e Mīmāṃsā, que significa "investigação", foi fundada por Jaimini. Seu objetivo é ensinar a arte de raciocinar, cujo propósito é a interpretação dos Vedas.


É a escola Mīmāṃsā antiga, para diferenciá-la da nova, que é o Vedānta.


A palavra "Mīmāṃsā" significa "pesquisa", derivada da raiz sânscrita man ("pensar", "examinar", "meditar"). Embora a pedra angular deste sistema sejam os próprios Vedas, o objeto real de sua compreensão é o conteúdo e a interpretação desses textos. Esta escola baseia-se nos hinos mais antigos e propõe-se a dar regras para a sua interpretação. Ritualista por natureza, ela pôs de lado a metafísica e a especulação filosófica. Dada a importância do "texto sagrado" ou revelado (śruti), dedicou-se principalmente à teoria do conhecimento e à epistemologia.


A escola Mīmāṃsā, também conhecida como Dharma (Lei) Mīmāṃsā ou Karma (Ação) Mīmāṃsā, se destaca por analisar os deveres védicos e enfatizar a ação ritual. Embora essa escola tenha desaparecido na Índia, sua influência permanece presente no sistema legal e nas práticas diárias.


Os Mīmāṃsāsūtras, compilados por Jaimini, são o texto fundamental dessa escola. Ela rejeita os ciclos de nascimento e renascimento, afirmando a eternidade dos Vedas. A filosofia é pluralista e realista, defendendo a existência independente de seres e fenômenos. Para os seguidores da escola, os Vedas são a autoridade suprema que estabelece o Dharma. O sacrifício ritual é considerado essencial para alcançar o céu. Quanto à libertação (mokṣa), é vista de diferentes maneiras, desde um estado de consciência feliz até uma perfeita realidade inconsciente, dependendo da interpretação.


Essas escolas também podem ser resumidas da seguinte forma:


  • Vaiśeṣika é a teoria atômica, que estuda a natureza da matéria e analisa a composição fundamental do universo.


  • Saṃkhya é a teoria da evolução, que ensina como todos os princípios se desdobram a partir do princípio mais sutil. Ela também aborda a relação entre Purusha (o espírito) e Prakṛti (a matéria).


  • Vedānta ensina a distinção entre Paramātman (o Ser Supremo) e Ātman (o Ser individual), enfatizando a unidade entre o Eu individual e a Realidade Absoluta.


  • Nyāya ensina a fazer deduções lógicas a partir das experiências sensoriais, sendo o mapa da caminhada, o raciocínio, a lógica que orienta o conhecimento.


  • Mīmāṃsā é o guia experimental, a bússola, o método que indica como fazer experiências para interpretar e compreender os Vedas.


  • Yoga ensina a colocar a teoria em prática, integrando a disciplina mental e física para alcançar a união com o divino e a realização espiritual.





Historicamente, a Lógica (Nyāya) e o Atomismo (Vaiśeṣika) se unificaram, resultando em uma concepção de mundo que, embora semelhante à nossa ciência atual, não é rigidamente materialista. A Yoga se associou ao Saṃkhya, tornando-o o fundamento filosófico para suas práticas de elevação da consciência. A Pūrva Mīmāṃsā evoluiu para o código cerimonial e legal dos Vedas e da sociedade hindu, enquanto a Uttara Mīmāṃsā ou Vedānta, ligada às Upaniṣads e à sua interpretação, tornou-se a escola mais metafísica, absorvendo ao longo dos séculos as outras escolas e utilizando-as como instrumentos.


Ao contrário das escolas ocidentais de filosofia, que frequentemente entram em conflito umas com as outras, os Dārśanas do Hinduísmo constituem, na realidade, uma unidade. Embora apresentem diferentes pontos de vista e perspectivas distintas, não divergem em seu conteúdo essencial. Em síntese, não são resultados de uma mente fragmentadora, que divide a realidade, mas sim de uma consciência que a revela, organizando-a, ainda que cada escola siga métodos distintos.


Todas essas Dārśanas almejam dissipar a ignorância e seus efeitos de angústia e sofrimento, visando alcançar a libertação (mokṣa) e a união da alma individual (jīva-ātman) com a universal (Brahman ou Paramātman). No entanto, a forma como cada uma concebe a ignorância varia.


Para a escola Nyāya (ou Lógica), a ignorância é simplesmente um conhecimento falso, uma interpretação equivocada das coisas. Já para a escola Saṃkhya, a ignorância é a falta de discernimento (viveka) entre o real e o irreal, a dificuldade de distinguir um do outro, a ausência de visão para reconhecer detalhes e importâncias. Para a escola Vedānta, a ignorância é avidyā, a carência de compreensão e percepção da realidade, uma ilusão que nos confunde. Provavelmente, a realidade está em um lugar onde todas essas interpretações são válidas ao mesmo tempo.


O núcleo essencial de todas essas escolas, que permitiu aos ṛṣis (sábios videntes) ler os hinos védicos na Mente Divina como decretos da Alma da Natureza, foi esquecido e acabou por se transformar simplesmente em conceitos e doutrinas religiosas fragmentadas.


Blavatsky explica que esses caminhos para o Real são perspectivas diferentes, comparáveis às seis faces de um cubo, e que a essência, síntese, raiz e verdadeira explicação são encontradas no Ātman Vidyā (Ātman - Ser, Vidyā - Saber), ou seja, na Ciência do Ser. Isso implica que esse conhecimento emana da doutrina secreta dos iniciados, a partir deste conhecimento oculto, ou Gupta Vidyā (Gupta - Secreto, Vidyā - Saber).





As escolas heterodoxas, também conhecidas como Nāstika Dārśanas, são assim denominadas por não adorarem nem reconhecerem deuses ou ídolos, conforme o significado do termo sânscrito "Nāstika", que se refere àqueles que não acreditam em uma divindade superior.

Três dessas escolas merecem destaque devido à sua grande influência e às sólidas bases de raciocínio e prática:


Chāraka


A Escola Filosófica e de Medicina criada por Chāraka Sesha baseia-se no estudo racional e material do ser humano, buscando compreendê-lo através de seu comportamento, saúde e karma. A tradição Chāraka enfatiza a medicina como um campo de conhecimento profundamente interligado com a filosofia da vida e a compreensão do corpo e da mente como uma unidade.


Jainismo


O Jainismo, fundado por Mahāvīra, precedeu o Budismo indiano e possui grande semelhança com ele, especialmente em relação à ênfase na não-violência (ahimsa), no ascetismo e na busca pela libertação da alma. Essa tradição se destaca por sua visão radical da ética, na qual a purificação da alma ocorre através da renúncia e do autodomínio, levando à libertação (mokṣa).


Budismo


O Buddhismo (ou Budismo), fundado por Siddhārtha Gautama, também conhecido como Buddha (ou Buda), é uma das maiores religiões do mundo. No entanto, muitos de seus praticantes não o consideram uma religião no sentido convencional, mas sim uma filosofia ou uma prática de vida. Essa percepção varia de acordo com a linhagem budista e com a interpretação dos ensinamentos de Buda. O Budismo se distingue pela busca do nirvāṇa, o estado de liberação do sofrimento e do ciclo de renascimento, enfatizando a prática da meditação, a ética da compaixão e o entendimento das Quatro Nobres Verdades.





Blavatsky utilizava a expressão "Budismo Esotérico" para distinguir o ensinamento iniciático do Budismo praticado pelas massas. No entanto, esse termo está em desuso atualmente, devido ao conhecimento mais aprofundado sobre as diversas linhagens budistas.


O Budismo é composto por várias escolas, cada uma com características distintas. As mais conhecidas são a Theravāda (Ensinamento dos Anciãos) e a Mahāyāna (Grande Veículo). Dentro da tradição Mahāyāna, existem diversas linhas, com destaque para a Vajrayāna, que é a maior delas. O Budismo Zen e o Budismo da Terra Pura também fazem parte do escopo Mahāyāna.


A Vajrayāna, também conhecida como o Veículo de Diamante, é uma forma essencialmente tântrica e está mais próxima do que Blavatsky se referia como "budismo esotérico". No entanto, é importante notar que práticas tântricas e esotéricas podem ser encontradas em todas as linhagens budistas, embora com ênfases e formas de prática distintas.




É importante entendermos o que significa Tantra. O termo Tantra pode ser visto como um sistema presente nas tradições esotéricas do Hinduísmo, Budismo e Jainismo. Nos textos pré e pós-védicos, o significado contextual de Tantra refere-se a algo que é "parte principal ou essencial", "ponto principal", "modelo", "estrutura" ou "característica". Nas escrituras do Hinduísmo e do Jainismo, o termo é frequentemente associado a "doutrina", "regra", "teoria", "método", "técnica" ou "capítulo", podendo aparecer tanto como uma palavra isolada quanto como sufixo, como em Ātman-tantra, que se traduz como "doutrina ou teoria de Ātman" (alma, eu).


No Budismo, Hinduísmo e Jainismo, Tantra também é uma categoria bibliográfica, semelhante ao termo Sūtra, que significa "costurar junto". Ambos os termos refletem a ideia de uma interconexão, sendo Tantra frequentemente relacionado ao conceito de "tecer" ou "unir". Por exemplo, textos budistas podem ser chamados tanto de Tantra quanto de Sūtra. O Vairocabhisambodhi-tantra, por exemplo, também é conhecido como o Vairocabhisambodhi-sūtra.


Portanto, Tantra se refere a um sistema que abrange a essência da doutrina ou uma forma textual que aborda o que é essencial. Na prática, Tantra pode ser definido como uma "tecnologia mística", um conjunto de métodos que permite ao praticante avançar mais rapidamente no caminho da liberação espiritual. É comum que o termo Tantra seja utilizado para se referir à seção esotérica do ensinamento.


Vale lembrar que "esotérico" (com s) refere-se a um ensinamento secreto ou oculto, destinado a ser compartilhado apenas com iniciados. Já "exotérico" (com x) descreve o ensinamento aberto e acessível ao público em geral. Por esta razão, Blavatsky usa a expressão "budismo esotérico" para se referir às práticas e ensinamentos reservados aos iniciados dentro do Budismo.


Os Vedas, que antecedem o Tantra, também possuem uma seção mais esotérica conhecida como Upaniṣads. O termo "Upaniṣad" deriva das palavras sânscritas upa (perto), ni (embaixo) e śad (sentar), simbolizando o ato de sentar-se próximo a um mestre espiritual para receber instruções profundas. Nos Upaniṣads, encontramos ensinamentos que se relacionam com o Yoga, cujas raízes remontam a um período ainda anterior ao dos próprios Vedas.




Em essência, as escolas filosóficas da Índia oferecem uma vasta riqueza de perspectivas e práticas que buscam compreender a natureza da realidade, o propósito da existência e o caminho para a iluminação. Cada uma delas propõe uma abordagem única, mas igualmente valiosa, que enriquece o panorama da sabedoria humana. O mais fascinante é perceber que, apesar das divergências, há uma essência comum que atravessa todas essas tradições – um profundo anseio pela verdade última e pela compreensão integral do ser humano e do universo.


Como Blavatsky destaca em sua obra "A Doutrina Secreta", a filosofia esotérica funciona como o elo que une todos esses métodos, revelando as interconexões sutis entre eles e a fonte universal de conhecimento. Ao explorar essas escolas, somos convidados a embarcar em uma jornada de descoberta e crescimento espiritual, transcendendo as limitações do tempo e da cultura, a fim de alcançar a essência da verdade.

Na Trilha dos Mistérios


Pela Santa Ciência!


 
 
 

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